Você alerta para a mudança do papel nos negócios nesse século, qual é a nova visão que devemos ter?
Bruna Rezende – O mundo tem mudado de forma muito acelerada, contudo continuamos pensando em sua concepção como fazíamos há 500 anos. Nós separamos tudo: oferta X demanda, direito X esquerdo, humano X natureza, masculino X feminino, escassez X abundância. Essa foi a forma que encontramos de criar raciocínios lógicos e foi importante para nossa evolução. Mas hoje sabemos que a vida é um sistema vivo e interconectado. Como todo ser vivo, nossa vida tem condições e limitações claras para se manter por aqui. Precisamos é de uma visão maior, que nos oriente para, através dos negócios, atuarmos melhor como força transformadora de realidades, que já somos. A boa notícia é que entramos na década das mais importantes mudanças da história da humanidade, para a construção de um futuro viável. O ESG, acrônimo que trás Environment (meio ambiente), Social (social) e Governance (governança), contribui na construção de um novo modelo capitalista, em que colocamos na conta de geração de valor e retorno, não só os acionistas, mas também os vários grupos de interesses da empresa (multistakeholders): colaboradores, clientes, fornecedores, e investidores. E, sobretudo, a natureza. Seja por pressão ou por demandas regulatórias, não há mais outra alternativa a não ser buscar uma nova via, para nosso desenvolvimento. Entendo que há cada vez mais espaço para a economia regenerativa.
Mas o que é a chamada economia regenerativa?
Bruna Rezende – A economia regenerativa é o sistema que deseja substituir a lógica linear de exploração de matérias-primas, produção e consumo, por uma lógica circular, que propõe a tomada de decisões que atendam às necessidades das pessoas sem degenerar os sistemas naturais, com orientação a longo prazo, com o propósito de combater as desigualdades sociais e conservar a biodiversidade. É um termo cunhado ainda em 1945, que vem ganhando cada vez mais força. Mas é claro que essa mudança de conceito não acontece para todos, de uma só vez. A gradativa mudança da mentalidade de empresas e de governos, que são capazes de promover grandes transformações, nos levará pouco a pouco a mudar a forma como fazemos negócios e nos relacionamos com a natureza. Afinal, não podemos esquecer que a vida prospera de inúmeras maneiras, principalmente por meio de redes, parceria, colaboração e dessa visão sistêmica e viva.
A nova geração traz como premissa que a prosperidade pode ser compartilhada? Será que as empresas estão se preparando como deviam?
Bruna Rezende – A chamada Ethical Generation, formada pelos millenials (nascidos entre as décadas de 1980 e 1990) e a Geração Z (nascidos na metade dos anos 90 e meados dos anos 2.000) em um futuro próximo desistirão de trabalhar, investir ou comprar de empresas que priorizem apenas o retorno financeiro, sem levar em conta os valores praticados. No ano 2030, eles formarão 75% da classe trabalhista. Então temos uma janela de oito anos para nos preparar para isso. Em termos históricos é muito pouco tempo. Mas estamos vivendo transformações aceleradas, por conta até da própria tecnologia que nos conecta, então é possível sim iniciar uma preparação para essa mudanças vigente. Esse é também um entendimento fundamental porque não é mais suficiente que os negócios gerem valor para um segmento de cliente apenas, enquanto destrói valor de forma sistêmica. Negócios generativos são capazes de considerar seus impactos num período de tempo maior. Considerar o retorno ambiental e social como forma de gerar oportunidades para o negócio é o que chamamos de ganha-ganha-ganha. A empresa ganha (acionistas e colaboradores), as pessoas ganham (clientes e grupos de interesses externos) e o planeta ganha. Esses são negócios generativos, em que a geração de valor é compartilhada.
Qual a diferença da preocupação social de outrora, e a nova vocação para o ESG?
Bruna Rezende – Vejo que o ESG hoje tem o respaldo da consciência econômica, ou seja, quando vemos que até 2025, 50% dos fundos de investimento serão ESG, estamos falando a linguagem do novo mundo dos negócios. A conta ambiental chegou a um ponto que não é mais uma questão de preservação, mas de regeneração. Há pressão de vários lados. E esse é um bom caminho. Não é um mundo de boas intenções, mas de ações. E o ESG não é um bicho de sete cabeças. É preciso estabelecer métricas de sucesso, que vão nos levar a avançar. Qual é o menor maior passo que a gente pode dar hoje em direção à uma postura ESG? Essa é uma jornada de ciclos contínuos de aprendizado. E nem todas as empresas necessariamente precisam abraçar todo o conceito de uma vez só, o importante é ir avançando, nem que seja aos poucos, mas com consistência e foco.
“Seja por pressão ou por demandas regulatórias, não há mais outra alternativa a não ser buscar uma nova via, para nosso desenvolvimento. A boa notícia é que entramos na década das mais importantes mudanças da história da humanidade, para a construção de um futuro viável”.
“São as pessoas que vão tomar decisões e promover a transformação. Formar uma consciência, capacitar pessoas transformacionais para esse momento e ser o guardião desse processo internamente, estão no escopo do RH Estratégico. Precisamos de novos profissionais para a nova economia, regenerar relações, criar ambientes menos tóxicos. Mais cedo ou mais tarde, todos vão embarcar nessa nova era. O bom é saber disso e ir em frente”.
Bruna Rezende, fundadora da Iris
Convidada pela HSM para falar ao Diretivo RH em um encontro sobre ESG realizado em junho, Bruna Rezende é economista com MBA pela Berlin School of Creative Leadership, com MBA Executivo pelo Insper, e atua há 15 anos desenvolvendo negócios com propósito e inovação. Foi sócia e CEO da Laje, plataforma de inovação que desenvolve projetos de estratégia, inovação em negócios e transformação cultural em diversos países, liberando projetos em empresas como Natura, Itaú, Linkedin, B2W, Raízen, Johnson & Johnson, Globo P&G, dentre outras. Hoje ela é uma empreendedora serial e fundadora da IRIS, empresa que atua para viabilizar negócios generativos através da estratégia transformativa.
Para saber mais www.entre-iris.com